Como tornar o inglês acessível e não elitista
English & Social Justice hackeia o sistema com foco em pessoas negras
Quantas vezes você já viu uma vaga de emprego que parece ter sido feita para você mas exige inglês fluente e você não tem? Comigo já rolou diversas vezes. É triste. Esse texto não é um publi, mas se você também passa por isso, convido você a continuar lendo até o final porque gostaria de apresentar um projeto que está mudando minha relação – que nunca foi fácil – com o idioma. Estou virando a chave do “eu preciso” para o “eu gosto”.
Por mais que alguns processos seletivos estejam abrindo mão da exigência do inglês, oportunizando que os contratados acessem cursos com apoio da empresa como parte das políticas de diversidade e ESG, não é o que acontece na maioria dos lugares. Também não é assim em processos seletivos de mestrado e doutorado. Na minha primeira tentativa de ingressar no mestrado tive uma boa nota, mas reprovei no inglês.
Não foi por falta de tentativas de estudar a língua. Quando era criança, não rolava grana para o curso. Na adolescência, tentei estudar no Cursos de Línguas Abertos à Comunidade (CLAC) na UFRJ. Era bem mais barato que um curso convencional, os professores eram estudantes da Faculdade de Letras e dava para juntar dinheiro para pagar. O problema eram as duas horas de casa até a Ilha do Fundão. Acabei desistindo no meio do caminho. Tentei outras vezes. Passei por humilhações nessas tentativas. Pedi ajuda para um colega de faculdade que sempre me corrigia e ele disse que não tinha condições de me ensinar porque não saberia lidar com alguém em um nível tão básico e me sugeriu estudar com crianças. Nesse dia, eu chorei. Cansei e dei um tempo.
O inglês envolve uma série de traumas e recortes de desigualdades na minha trajetória. Mas resolvi voltar a estudar e conheci o English & Social Justice Program. Um curso voltado para pessoas negras e periféricas, com o recorte para o debate social, racial e de gênero e ainda por cima com um preço que consigo pagar (R$85 por mês). Minhas segundas e quartas à noite mudaram, passei a ter vontade de assistir às aulas, de debater com os colegas e de estudar. O conteúdo sempre mescla gramática e algum debate sobre uma autora negra ou uma música que tenha letra relacionada aos temas do curso. Não tem “The book is on the table”.
Eu fiz questão de escrever sobre minha relação com o inglês e sobre essa boa descoberta que foi o English & Social Justice Program porque as inscrições para o próximo semestre estão abertas e outras pessoas também podem mudar sua relação com o idioma. Conversei com o meu teacher Jackson Schmiedek que respondeu três perguntinhas sobre o projeto.
Como nasceu o ESJ e por que um curso voltado para pessoas negras periféricas? O English & Social Justice nasceu quando a posdoc em afrolatinidades, Priscilla Ferreira, começou a lecionar inglês em coletivos como o Mulheres de Pedra, em Pedra de Guaratiba, Zona Oeste, no Rio de Janeiro, em 2019. O intuito era dar acessibilidade à comunidade afrodiasporíca como ativistas do movimento negro, acadêmicos, pessoas periféricas. A ideia é subverter o uso elitista da língua. E o curso surge com uma visão de economia solidária em prol do coletivo.
Algumas pessoas negras, me incluo nessa, carregam traumas e histórico de humilhações por não ter domínio do inglês - alguns episódios atrelados a racismo. Como vocês lidam com esse perfil de aluno? No Brasil, nós temos um problema de base que impede que muitos negros acessem a língua e existe um preconceito de que o negro periférico nunca vai falar inglês porque não tem dinheiro para pagar um curso e essa ideia pode levar a situações que causam traumas. A gente procura solucionar os eventuais traumas. Trabalhamos com pessoas que já tentaram inúmeras vezes e saíram dos cursos. Nós deixamos o aluno relaxado e buscamos temas que façam parte da realidade dele. Outra questão é a pronúncia, padronizar como inglês americano ou britânico é uma forma de elitizar a língua. O mundo todo fala inglês e nós carregamos as nossas pronúncias diaspóricas. A gente também negocia valores e bolsas para que o aluno não desista por conta do dinheiro. Nós trabalhamos com economia solidária, o intuito é formar o aluno e não pegar o dinheiro dele.
Alguns processos seletivos deixaram de cobrar, mas de modo geral o mercado de trabalho e a vida acadêmica nos exige a língua inglesa. Como vocês veem esse tipo de exigência num país desigual, em que nem todos têm acesso ao estudo de idiomas, como o nosso? Os equipamentos e serviços que a educação tem para nos oferecer são negados, principalmente nas comunidades periféricas. É muito legal que alguns processos seletivos tenham deixado de cobrar a língua inglesa, mas a verdade é que as instituições continuam nos exigindo esse certificado como uma carta de alforria para mostrar ao capitão. A gente tenta imprimir na cabeça dos alunos uma educação libertária, resgatando dos nossos ancestrais a ideia de educação colaborativa, com todos aprendendo juntos. O aprendizado não é individual, mas sim coletivo.
Curtiu o English & Social Justice? As inscrições para as turmas do segundo semestre vão até o dia 31 de agosto. Acesse o link e veja como se matricular. Você pode fazer o curso de qualquer lugar, as aulas são online.
Vagas desta edição
Até hoje. Terminam nesta segunda-feira, dia 2, as de inscrições para a segunda turma do curso preparatório Negritude Brasileira no PhD. Na formação você aprende como aplicar para vagas fora do país. O curso divulga oportunidades e estimula a carreira acadêmica para pessoas negras. Veja como se aplicar.
Tech. Com mais de 10 horas de conteúdo gratuito, entre palestras, painéis, entrevistas especiais e atrações culturais, o Potências Negras Tech, que acontece no próximo dia 14, segue com inscrições abertas. Os participantes têm ainda direito a certificado. Inscreva-se.
Diverso. O Grupo Petrópolis busca Especialista de Diversidade, Inclusão e Engajamento. Profissional terá foco em gênero, raça/etnia, pessoas com Deficiência e LGBTI+, além de estruturar e acompanhar indicadores e relatórios e aplicar pesquisas de clima. Inscreva-se.
Juventude. O Unicef tem vaga para consultoria em Brasília (vaga afirmativa) para atuar em projeto com adolescentes e jovens. Entre as atividades, mapeamento de redes nacionais de adolescentes, contatos com lideranças e iniciativa da área. Veja o edital e como se aplicar.
E-commerce. A Amazon tem vaga aberta para Especialista de Gestão de Marcas (exclusiva para PCD). A oportunidade exige experiência em varejo, planejamento de inventário e de alocação, gestão de produto ou projeto, precificação e marketing. Candidate-se.
Social. O grupo Pão de Açúcar, em São Paulo, tem uma vaga aberta para Analista de Projetos Sociais Sr. Essa pessoa será responsável por apoiar e coordenar as ações do Instituto GPA, além de identificar oportunidades de comunicação e impulsionamento dos projetos e programas.
CRM. A Fundação Getúlio Vargas seleciona para vaga de Analista de CRM Pleno (Rio de Janeiro e São Paulo). Entre as principais atividades a estruturação e gestão de campanhas de e-mail marketing e SMS; acompanhar o resultado das campanhas, avaliando as principais métricas dos canais. Veja como candidatar-se.
Finanças. A fintech Creditas tem duas vagas afirmativas exclusivas para pessoas pretas. Uma delas é para Team Leader de Consultoria Comercial e a outra é na área de Team Leader de Formalização Autofin. Para candidatar-se é preciso acessar as vagas na página do LinkedIn da empresa.
Publi. O TikTok está com uma vaga de Head of Advertiser Experience, Monetization Integrity para a América Latina. Nesta função, a pessoa será responsável pelo contato com anunciantes e aprimoramento das estratégias de monetização. Veja como se aplicar.
Formação. Se você está cursando ou é graduada (bacharel ou tecnóloga) em algum curso relacionado a tecnologia, tem bons conhecimentos de lógica e disponibilidade diária para realizar o treinamento, pode se inscrever no Programa Entry Point BRQ – Exclusivo para mulheres. Veja como participar.
Temporário. O fundo FRIDA está buscando uma profissional para cobrir a licença maternidade na vaga de Co-Gerente de Programas. A candidata ideal é uma líder feminista dinâmica e confiante, que será responsável pelo trabalho de Fortalecimento da Capacidade (CS) e Doações Especiais (SG) da entidade. Veja os detalhes.
Direito.A DuAgro, Ag Fintech fundada pela VERT e XP, está com vaga de estágio na área de Jurídico e Compliance. Podem se candidatar estudantes cursando o 4º ou 5º ano de direito, com inglês fluente e experiência em contratos e societários. Tem interesse? E-mai com o seu CV para thais@duagro.agr.br.
Pra pensar…
Algumas das medalhas conquistadas pelos atletas brasileiros são celebradas com o já conhecido discurso de superação, meritocracia, esforço e dedicação. Uma armadilha perigosa engolir esse papo e ignorar as dificuldades, falta de apoio e de oportunidades iguais de treinamento e preparação que muitos deles enfrentam.
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💻 Com curadoria, redação e edição de Emílio Moreno e Juliana Gonçalves. Direção de arte, Larissa Cargnin.
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